Volta de bandeiras nos estádios: retorno das torcidas organizadas?
O Projeto de Lei n. 177/2010, aprovado recentemente pela Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, com meu voto contrário, e encaminhado para sanção do Governador do Estado, dentre outras providências, permitiu o porte de mastros de madeira e bambu para membros de torcidas organizadas dentro dos estádios paulistas. Embora sua finalidade originária seja a de servir de suporte para bandeiras, não há dúvida de que também constituem instrumentos de ataque, as chamadas armas impróprias.
Em 20 de agosto de 1995, o adolescente Márcio Gasparin foi assassinado dentro do estádio do Pacaembu com dois golpes na parte de trás de sua cabeça, desferidos por um torcedor mediante o uso de um pedaço de pau. Naquele triste dia, por causa de um jogo de juniores, ocorreu um confronto entre torcedores de Palmeiras e São Paulo dentro do gramado. Todos armados com pedras e paus, já que a partida se realizava com um estádio ainda em obras. Restos de construção viraram armas. Na hora do tumulto, o violento usa o que tem à mão.
Naquele momento, iniciou-se uma campanha contra as torcidas organizadas. Algumas foram extintas, voltaram com novas sedes e nomes; todas ficaram proibidas de ingressar no estádio com suas camisas e bandeiras e acabaram submetidas a um regime de restrição. Oito anos mais tarde, recadastradas, com um novo perfil e monitoradas de perto pela polícia e Ministério Público, tiveram seu retorno permitido. O resultado foi bem sucedido: em 1994, havia 16,4 ocorrências por jogo; por volta de 2005, 0,3. O panorama melhorou.
No entanto, fazer uma lei permitindo porte de mastros de madeira e bambu em estádios, é brincar com fogo. Tal fato não é para ser tratado em lei, retirando da polícia o poder de fiscalização e proibição em cada caso concreto.
A permissão legal causará grave retrocesso, provocando engessamento da ação preventiva da polícia militar, a quem deve competir discricionariamente, avaliar a conveniência e oportunidade da adoção de determinadas ações estratégicas. Somente os órgãos de execução são capazes de avaliar no caso concreto a conveniência ou não do uso das bandeiras, não cabendo ao Poder Legislativo fazê-lo mediante regra genérica e inflexível.
A permissão ou proibição pode ser vista pela PM em cada caso, ou pelo MP mediante termo de ajustamento de conduta, com maior agilidade e podem ser revistos a qualquer tempo. Trata-se, portanto, de ato discricionário dos órgãos de execução, que não pode ser engessado por lei.
Mesmo assim, ainda há esperança. Os defensores da medida dizem que os mastros serão cadastrados. Esperamos que o cadastro segure o braço do torcedor violento na hora do golpe fatal. Será?
*Fernando Capez é Procurador de Justiça licenciado e Deputado Estadual. Mestre pela USP e doutor pela PUC/SP. www.fernandocapez.com.br https://twitter.com/FernandoCapez