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Conceito sociológico de democracia: as democracias radical e liberal - Fernando Capez

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Conceito sociológico de democracia: as democracias radical e liberal

Professor Fernando Capez

Conceito sociológico de democracia: as democracias radical e liberal

Democracia é uma forma de governo que tem como característica precípua a escolha dos governantes pela sociedade. O regime democrático como conhecemos nos dias atuais teve seu início da Europa do século 18, contrastando com os regimes monárquicos absolutistas até então vigentes. Contudo, quando tratamos do conceito sociológico de democracia, não estamos diante de um conceito imutável.

Tal diferenciação se dá ao compararmos os regimes democráticos europeus com a democracia ateniense do século 5 a.C. Como visto, na Antiguidade a escolha dos representantes se dava diretamente, quando o corpo dos indivíduos com direitos políticos se reuniam e opinavam sobre as questões coletivas da pólis. Nota-se, portanto, que naquele período histórico o conceito de democracia não estava relacionado com o governo da maioria, até porque os cidadãos atenienses com direitos políticos eram a minoria da população, mas sim, com uma forma de deliberação coletiva dos homens adultos, filhos de pai e mãe atenienses.

Nas palavras de Denis. L. Rosenfield [1], a democracia ateniense era, sobretudo, um valor ligado à noção de liberdade política, ao bem viver, ou seja, a convivência harmoniosa da coletividade em razão das decisões dos homens bons e justos. Salienta, ainda, que a democracia grega foi pioneira ao dar elevado valor à “coisa pública” e ao debate de opiniões contrárias.

A democracia europeia moderna, por sua vez, não perpetuou o modelo estabelecido na Ágora grega, mas constituiu um espaço administrativo e burocrático comandado pela burguesia emergente, fora do contato direto com o povo. Tal modelo, replicado até os dias atuais, se dá pela eleição de representantes da maioria, que municiados de mandato eletivo, tomam as decisões em nome das pessoas.

Nesse sentido, o voto passa a ser instrumento de escolha limitado do exercício democrático. Em verdade, da modernidade aos dias atuais, equivocadamente tem-se difundido a concepção de democracia como mera via eleitoral; porém, como sabemos, viver em um estado democrático vai muito além do direito de eleger representantes.

Conforme a concepção sociológica de Boudon e Bourricaud [2], a democracia moderna se subdivide em democracia radical e democracia liberal. O primeiro, consubstanciado na forma de governo da Inglaterra e dos EUA, priorizou a liberdade, protegendo os interesses particulares da autoridade estatal. Entendeu o conceito de igualdade apenas como a ausência de privilégios injustificados e garantia de meios que permitam com que as pessoas realizem suas potencialidades conforme seu mérito.

A democracia liberal, concebida por J. J. Rousseau, enfatizou a igualdade e viu a fraternidade como sinônimo de civismo. Ao passo que a democracia liberal defendeu a separação dos Poderes e propôs o pluricameralismo, a democracia radical buscou simplificar o Poder por intermédio de uma assembleia única, no qual o governo seria representado apenas por um comitê executivo, podendo ser dissolvido e reformado a qualquer momento.

Mesmo com suas diferenças, as democracias radicais e liberais encontram seu denominador comum na desconfiança do indivíduo em relação ao governante. Desta forma, apenas um conjunto de pessoas poderia definir quais os ditames da sociedade, funcionando os representantes eleitos como meros prepostos da vontade popular.

De forma geral, quase todos os regimes ocidentais se qualificaram como democráticos, fazendo crer que exerciam o poder legitimamente, de modo a atender as aspirações de seu povo. Tal paradoxo pode ser observado nos discursos de Adolf Hitler aos membros N.S.D.A.P (Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei), que mesmo considerando a democracia como um regime corrompido, afirmou que o nazismo era a legítima tradução da vontade do povo alemão. O mesmo pode se dizer de Francisco Franco, que alcunhou seu autoritário regime como uma “democracia orgânica”, e até mesmo do Partido Comunista Soviético, que depois de solapar o regime dos Romanov, se considerou a “vanguarda do proletariado”.

Contemporaneamente assistimos à expansão do conceito de regime democrático para além dos países ocidentais, alcançando nações com tradição de centralização política em torno de um líder religioso, tal como ocorre na teocracia iraniana, ou de um monarca absolutista, como na Arábia Saudita ou nos Emirados Árabes Unidos. Muito em função da globalização e do avanço tecnológico, que permitiram o fluxo de ideias, pessoas e mercadorias ao redor do mundo como nunca antes, mesmo nesses países, a busca de maior liberdade e igualdade entre as pessoas têm dominado o debate político.

A democracia contemporânea está longe de ser um regime perfeito, talvez nem tenha a pretensão de sê-lo; contudo, principalmente na Europa e EUA, se mostra como um sistema aberto, passível de reformas e formador de novas sociabilidades, dando proteção legal aos grupos minoritários da sociedade mesmo que com pouca representação política.

Ao falarmos de democracia moderna e contemporânea, não podemos deixar de citar a influência do pensamento iluminista do século 18, notadamente de J. J. Rousseau. Para o iluminista francês, por ser a democracia um regime dotado de virtudes, sua execução demandava homens de igual virtuosismo, que sobreporiam suas vontades individuais em busca do bem comum. A democracia concebida por Rousseau era a direta, tal qual ocorrera em Atenas, com as decisões em forma de deliberação, sem a eleição de representantes.

Rousseau entendia que a democracia somente seria possível com a participação popular, tanto nas decisões administrativas quanto no exercício de funções públicas, e renegava a ideia de representação indireta, afirmando que o verdadeiro cidadão de uma democracia jamais poderia transferir seu poder de escolha para terceiros [3].

Por estas razões, podemos dizer que a concepção sociológica de democracia é dinâmica, muitas vezes de difícil compreensão, que ao longo da história foi apropriada pelos regimes mais tirânicos. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, com o declínio dos regimes fascista e nazista, e, sobretudo, com a queda do muro de Berlim (1989) representando o colapso da União Soviética, a busca pela construção de um regime democrático de representação popular se tornou o objetivo de quase todas as nações do mundo, obviamente, respeitadas as peculiaridades de cada país.

Por ser um regime de participação indireta, com representantes eleitos periodicamente, onde a boa-fé dos oponentes deve prevalecer para a satisfação do bem comum, as democracias atuais se mostram frágeis, estando constantemente sob ataque de aventureiros autoritários, que sedizentes porta-vozes da vontade do povo, tentam obstruir o debate de ideias antagônicas e passar por cima das instituições.

Democracia é basicamente um regime institucional, fundado na representação popular em dois dos poderes estatais (Executivo e Legislativo), que funciona por meio de um aparato administrativo que deve sempre visar a soberania dos interesses públicos sobre os coletivos. Porém, compreender democracia em sua mais pura concepção vai além da forma de governo. O cidadão, empoderado de seus direitos, não é apenas uma pequena peça na engrenagem do sistema eleitoral, mas sim, agente histórico permanente, que pode exercer a democracia em seu cotidiano.

Dessa forma, a vontade popular pode ser exercida democraticamente em associações de bairro, igrejas, sindicatos, grêmios estudantis, assembleias gerais de edifícios e em tantos outros espaços, mais ou menos democráticos, em que os temas mais diversos devem ser tratados pelos membros da coletividade.

[1] ROSENFIELD, Denis L. O que é democracia. São Paulo. Ed. Brasiliense, 1994.

[2] BOUDON, Raymond; BOURRICAUD, François. Dicionário crítico de sociologia. São Paulo. Ed. Ática, 1993.

[3] ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social. São Paulo. Ed. Martins Fontes, 1996.

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