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As inovações legais relacionadas ao procedimento da prisão em flagrante

As inovações legais relacionadas ao procedimento da prisão em flagrante

Com o advento da Lei n. 11.449, de 15 de janeiro de 2007, que entrou em vigor no dia de sua publicação, isto é, em 16 de janeiro de 2007, algumas alterações foram promovidas no procedimento da prisão em flagrante.

Com efeito, o artigo 306 do Código de Processo Penal (CPP) apenas rezava que, após a prisão, a autoridade policial, dentro do prazo de 24 horas, deveria entregar a nota de culpa ao preso, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas. A Lei n. 11.449/2007, no entanto, alterou a redação do art. 306 do CPP, trazendo algumas novas exigências.

 

De acordo com a nova redação do art. 306, caput, “A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou a pessoa por ele indicada”.  O seu §1.º, por sua vez, dispõe: “Dentro em 24 h (vinte e quatro horas) depois da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante, acompanhado de todas as oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

 

O caput do art. 306 nada mais constitui do que reprodução literal do comando constitucional inserto no art. 5.º, LXII, o qual contém duas garantais individuais: (a) a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz; (b) a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente à família do preso ou a pessoa por ele indicada.

 

Buscando dar máxima aplicabilidade ao preceito constitucional contido na primeira parte do art. 5.º, LXII, da Constituição Federal (CF), impôs a Lei n. 11.449/07 que a autoridade policial, dentro de 24 (vinte e quatro horas) depois da prisão, encaminhe ao juiz competente o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas (art. 306, §1.º, 1.ª parte).  Embora a CF tenha determinado a imediata comunicação da prisão à autoridade competente, não havia qualquer previsão legal de prazo para que tal determinação fosse cumprida.

 

Assim, similarmente à entrega a nota de culpa, a lei impôs o prazo máximo de 24 horas após a prisão para o envio dos autos à autoridade competente.

 

A alteração legislativa visou propiciar ao preso a garantia de que a autoridade judiciária terá rápido acesso ao auto de prisão em flagrante, possibilitando, com isso, o imediato relaxamento da prisão, se ilegal, tal como determina o art. 5.º, LXV, da CF, impedindo, com isso, que o indivíduo seja mantido no cárcere indevidamente.

 

Essa modificação legal, contudo, suscita uma dúvida: O desrespeito à formalidade de entrega do auto de prisão em flagrante, no prazo de 24 horas, à autoridade competente, implicaria no relaxamento da prisão, tal como ocorre com a ausência da entrega da nota de culpa?

 

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia decidido no sentido da manutenção da prisão: “A Constituição da República, dentre as garantias individuais, registra o direito de a prisão ser comunicada ao juiz competente e a família do preso ou a pessoa por ele indicada (art. 5.º LXII). A inobservância é idônea para ilícito administrativo. Por si só, entretanto, não prejudicada a validade da investigação”. (STJ, 6.ª Turma, RHC 6210/GO, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 10/03/1997, DJ 12/05/1997, p. 18843, LEXSTJ 98/342)

 

Sem dúvida, haverá posicionamento no sentido de que a ausência de comunicação no prazo de 24 horas continuará a constituir infração administrativa e, conforme o caso, crime de abuso de autoridade previsto no art. 4.º, “a”, da Lei n. 4.898, de 09 de dezembro de 1965, mas o seu desrespeito não seria apto a macular  a validade da prisão em flagrante. Ora, se a prisão é formalmente perfeita, por que razão, o descumprimento do prazo pela autoridade policial teria o condão de torná-la ilegal? É a nossa posição.

 

Por outro lado, poderá haver posicionamento no sentido de que a nova Lei procurou erigir a garantia constitucional da comunicação imediata à autoridade competente em requisito formal expresso do auto de prisão em flagrante, cujo descumprimento poderá acarretar o seu relaxamento. O desrespeito ao prazo de 24 horas impediria que a autoridade judicial tivesse imediato acesso ao auto de prisão em flagrante para efeitos de controle de sua legalidade, o que macularia a manutenção da prisão do indivíduo.

 

Além dessa imposição legal, a Lei previu que, a autoridade policial estará, igualmente, obrigada, nesse mesmo prazo de 24 horas, após a prisão, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, a encaminhar cópia integral do auto de prisão em flagrante para a Defensoria Pública (art. 306, §1.º, 2.ª parte).

Como vimos a CF, em seu art.  5.º, LXII, e agora, o CPP, em seu  art. 306, garantem que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente à família do preso ou a pessoa por ele indicada[1], tendo a jurisprudência admitido que a assistência do advogado constituído, no momento da lavratura, supre a falta de comunicação de sua prisão à família (nesse sentido: STJ, 5ª T., RHC 2.526-1, rel. Min. Flaquer Scartezzini, j. 15-3-1993).   O art. 5.º, LXIII, por sua vez, preceitua que, “o preso será informado de seus direitos, entre os quais, o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada assistência da família e advogados”.

A garantia de assistência do advogado passou a ter plena aplicabilidade com o advento da n. Lei n. 11.449, de 15 de janeiro de 2007, uma vez que, se o advogado do preso não for informado de sua prisão, a autoridade policial será obrigada a remeter o auto de prisão em flagrante, no prazo de 24 horas da prisão, à Defensoria Pública.

Em homenagem ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a Lei procurou proteger aqueles que, por ausência de recursos financeiros, não têm condições de arcar com os honorários de um advogado, que lhes possibilite uma imediata assistência jurídica.

Com efeito, os presos em flagrante, sem um advogado designado, muitas vezes, só vinham a ter contato com um defensor no seu interrogatório judicial. Até que ocorresse esse contato direto, muito tempo já havia transcorrido entre a prisão em flagrante e a audiência do interrogatório, sendo o acusado, dessa forma, muitas vezes, mantido na prisão, sem que tivesse a oportunidade de pleitear o direito de responder ao processo em liberdade ou de obter o trancamento do inquérito policial ou ação penal. Com a inovação legislativa, a Defensoria Pública terá a oportunidade de, tão logo seja realizada a prisão em flagrante, analisar a  possibilidade de o acusado vir a responder ao processo em liberdade ou mesmo de obter o trancamento do inquérito.

A modificação legal adveio, portanto, com o intuito de propiciar o imediato conhecimento da prisão do indivíduo pela autoridade judiciária e pela Defensoria Pública, de forma a realizar um imediato controle de sua legalidade, e, com isso, impedir a manutenção injusta da segregação cautelar. Obviamente, tal modificação legislativa acabará por proporcionar uma diminuição na superlotação dos presídios, já que, os presos com direito à liberdade poderão ser imediatamente soltos.

Mencione-se que, caso o auto de prisão em flagrante não seja remetido para a Defensoria Pública no prazo de 24 horas, haverá a mesma discussão acima mencionada acerca da possibilidade ou não de haver o relaxamento da prisão.

Finalmente, no mesmo prazo de 24 horas, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e o das testemunhas. (art. 306, §2.º, com a redação determinada pela Lei n. 11.449/07). Dessa forma, a nota de culpa deve ser entregue ao preso dentro do prazo de 24 horas, a contar da prisão. Sua finalidade é comunicar ao preso o motivo da prisão, bem como a identidade de quem o prendeu (CF, art. 5.º, LXIV), fornecendo-lhe um breve relato do fato criminoso de que é acusado. A falta de entrega da nota de culpa provoca o relaxamento da prisão.

 

*Fernando Capez é Procurador de Justiça licenciado e Deputado Estadual.  Presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Mestre em Direito pela USP e doutor pela PUC/SP. Professor da Escola Superior do Ministério Público e de Cursos Preparatórios para Carreiras Jurídicas. Autor de várias obras jurídicas. www.fernandocapez.com.br – https://twitter.com/FernandoCapez

[1] Vale mencionar que o Superior Tribunal de Justiça vinha se manifestando no sentido de que, a falta de comunicação da prisão à família do preso ou à pessoa por ele indicada não implica relaxamento do flagrante. Nesse sentido: STJ, 6ª T., RHC 4.274-5/RJ, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, RSTJ, 12/257; 6ª Turma, RHC 11442/SC, Rel. Min. Vicente Leal, j. 11/12/2001, DJ 18/02/2002, p. 498; 6ª Turma, RHC 6210/GO, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 10/03/1997, DJ 12/05/1997, p. 18843, LEXSTJ 98/342.

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