Aplicação do Estatuto da Primeira Infância
Recentemente, foi publicada a Lei n. 13.257/16, já batizada pela doutrina como Estatuto da Primeira Infância.
A lei, que traz uma série de alterações no ECA, no CPP e na CLT, conceitua a primeira infância como o período que vai dos 6 até os 72 meses (ou 6 anos) de vida da criança e traz como diretriz principal a doutrina da proteção integral.
Tal doutrina tem origem internacional: a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e da Organização das Nações Unidas (1989) e a Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) conceituam crianças e adolescentes como titulares de direitos e, assim, as normas que cuidam de tais sujeitos devem concebê-los como cidadãos plenos, porém sujeitos à proteção prioritária, tendo em vista que são pessoas em desenvolvimento (físico, psicológico e moral).
A par desse princípio basilar, uma das alterações trazidas pela citada lei é a inclusão, no art. 31 do CPP, de dois novos incisos. O referido artigo elenca os casos em que o juiz pode substituir a prisão preventiva pela domiciliar, rol que foi agora acrescido das seguintes situações:
IV – gestante;
V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
VI – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Notável que o que se pretendeu foi justamente dar suporte à garantia do desenvolvimento infantil integral e fortalecer a família como responsável pelo cuidado e educação dos filhos na primeira infância (art. 14 da Lei n. 13.257/16).
Com base nessa alteração legislativa, o STJ concedeu liminar para substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar no caso de uma jovem de 19 anos, mãe de uma criança de 2 anos e grávida, acusada de tráfico de drogas.
Importante observar, contudo, que a decisão não se fundamentou apenas na novel legislação.
O Ministro Rogerio Schietti Cruz asseverou que, no caso, o juiz de primeiro grau não indicou as peculiaridades que justificavam a prisão preventiva da acusada. Cabe lembrar, aqui, que a manutenção da prisão preventiva deve ser amplamente motivada, não bastante para tanto simples menção genérica à presença dos fundamentos previstos no art. 311 e seguintes do CPP.
O ministro ainda pontuou que “a prisão domiciliar é medida adequada para evitar a prática de outras infrações penais (art. 282, I, CPP), diante das condições favoráveis que ostenta (primariedade e residência fixa), e de não haver demonstração de sua periculosidade concreta, que pudesse autorizar o recurso à cautela extrema como a única hipótese a tutelar a ordem pública”.
*Fernando Capez é Procurador de Justiça licenciado, Deputado Estadual, e Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Mestre em Direito pela USP e Doutor pela PUC/SP. Professor Honorário da Universidade Presbiteriana Mackenzie, da Escola Superior do Ministério Público e de Cursos Preparatórios para Carreiras Jurídicas. Autor de obras jurídicas. É também Presidente do Colégio de Presidentes das Assembleias Legislativas do Brasil.